Sentado em um pequeno morro, me dou conta de que, como as pinturas expressionistas, ela fica muito mais bela de longe. Embora a distância me prive do seu jeito divertido, do seu cheiro adocicado, da música que vibra por cada poro seu, me ausenta também de tudo o que impede o meu amor. Agora entendo porque tantos se apaixonam por ela. Por medo ou por querer mantê-la intocável, certamente nunca se aproximam o suficiente e a observam sempre como a observo agora. Assim, de fato, é impossível não a desejar.
Contudo, um dia eu cheguei perto. Perto demais. E não foi difícil para ela me seduzir. Com suas histórias, com suas filosofias, com seu olhar, distinto de todos os que já havia conhecido. Levava-me a incríveis passeios, nos quais tentava me convencer de que não precisávamos de muito para viver. Mostrava-me em voz miúda porém, o limite para o pouco − em sua vida, ultrapassado o tempo inteiro. Ainda que jamais admitisse, só não passava fome porque sabia bem se virar. Um trambique aqui, uma malandragem ali e, no fim, as coisas se ajeitavam. Era triste vê-la maltrapilha. Logo ela, que era tão bonita.
Tinha muitos filhos, mas parecia se importar mais com os filhos dos outros. Estava doente, creio eu. Louca, talvez. Era incompreensível, para mim, o caminho que tinha tomado. Como tão talentosa e capaz, se contentava com o nada que lhe era oferecido. Eu sabia que sua criação tinha sido muito complicada. O que não lhe havia sido imposto, havia sido proibido. Entretanto, se era tão idealista e teimosa, por que não argumentava? Estava bem crescida para tomar outro rumo. Tão forte e, às vezes, um bichinho assustado.
Sentia por ela um misto de pena, raiva e paixão. Ainda que exercesse um grande encantamento sobre mim, nunca pude perdoar todas as mentiras que me disse. Que dizia a todos. Na realidade, não sei ao certo se eram mentiras ou ilusões. Não sei se ela tinha vergonha do fracasso ou se, em sua insanidade, realmente acreditava que havia chegado ao triunfo. O que sei é que quase tudo o que contava era irreal. E, estranhamente, isso era o que mais atraía a todos.Quando estávamos juntos, havia sempre a próxima dança, embalada pelo rum. Ela era o meu paraíso-prisão e não posso negar que me envolvi, mas amá-la seria doloroso demais. Por isso, me afastei. Porque daqui, ela é só poesia. Uma obra de Van Gogh. Tão linda que até esqueço de guardar mágoa. E tão frágil que minha única vontade é pô-la nos braços e num acalanto, dizer: calma, Cuba querida, a liberdade já vem.
Contudo, um dia eu cheguei perto. Perto demais. E não foi difícil para ela me seduzir. Com suas histórias, com suas filosofias, com seu olhar, distinto de todos os que já havia conhecido. Levava-me a incríveis passeios, nos quais tentava me convencer de que não precisávamos de muito para viver. Mostrava-me em voz miúda porém, o limite para o pouco − em sua vida, ultrapassado o tempo inteiro. Ainda que jamais admitisse, só não passava fome porque sabia bem se virar. Um trambique aqui, uma malandragem ali e, no fim, as coisas se ajeitavam. Era triste vê-la maltrapilha. Logo ela, que era tão bonita.
Tinha muitos filhos, mas parecia se importar mais com os filhos dos outros. Estava doente, creio eu. Louca, talvez. Era incompreensível, para mim, o caminho que tinha tomado. Como tão talentosa e capaz, se contentava com o nada que lhe era oferecido. Eu sabia que sua criação tinha sido muito complicada. O que não lhe havia sido imposto, havia sido proibido. Entretanto, se era tão idealista e teimosa, por que não argumentava? Estava bem crescida para tomar outro rumo. Tão forte e, às vezes, um bichinho assustado.
Sentia por ela um misto de pena, raiva e paixão. Ainda que exercesse um grande encantamento sobre mim, nunca pude perdoar todas as mentiras que me disse. Que dizia a todos. Na realidade, não sei ao certo se eram mentiras ou ilusões. Não sei se ela tinha vergonha do fracasso ou se, em sua insanidade, realmente acreditava que havia chegado ao triunfo. O que sei é que quase tudo o que contava era irreal. E, estranhamente, isso era o que mais atraía a todos.Quando estávamos juntos, havia sempre a próxima dança, embalada pelo rum. Ela era o meu paraíso-prisão e não posso negar que me envolvi, mas amá-la seria doloroso demais. Por isso, me afastei. Porque daqui, ela é só poesia. Uma obra de Van Gogh. Tão linda que até esqueço de guardar mágoa. E tão frágil que minha única vontade é pô-la nos braços e num acalanto, dizer: calma, Cuba querida, a liberdade já vem.
* Texto publicado no Livro Pedra, Papel e Tesoura, lançado em 2008